Cacia Regina e o trabalho que ajuda o próximo

Mês da Mulher
Perfil
Cacia Regina transporta pessoas do interior até a capital do Piauí

A relação de Cacia Regina França Araújo com o transporte começou quando ela era ainda menina. Aos 14 anos, trabalhando como doméstica em Itaueiras (PI), ela sempre ia a um posto de gasolina passear. “Eu ficava perplexa com as carretas. Pra mim era um sonho poder trabalhar com os pesados, mas com aquela idade era impossível.”

Aos 18 anos, Cacia foi morar em São Paulo (SP) em busca de uma nova vida. Em 2012, após uma decepção que ela prefere não revelar, Cacia entrou em uma autoescola e assim que conseguiu a categoria D foi atrás de um trabalho. A oportunidade surgiu em uma empresa de transporte do grande ABC. “Quando me contrataram, disseram que havia um plano de carreira que começava em carros pequenos, passando por van, micro e por último ônibus. Eu comecei dirigindo carros pequenos”, conta.

Mulheres x Homens

“No começo, eu fiquei empolgada, mas crescer dentro de uma empresa é muito difícil, principalmente quando você entra com a cara e a coragem. A mulher era muito discriminada, apesar da oportunidade. Meninos mais novos que nós mulheres entravam na empresa, às vezes nem tinham categoria D, e os colocavam no ônibus ou micro. Nós mulheres tínhamos que passar por toda a trajetória: carro pequeno – van – micro e por último ônibus. O máximo que eu e outras conseguimos chegar foi em micro, com muito sacrifício e briga”, relata. Por conta dessa frustração, Cacia decidiu trabalhar por conta própria.

Cacia entrou em uma autoescola e assim que conseguiu a categoria D foi atrás de um trabalho (Foto: Arquivo pessoal)
Cacia entrou em uma autoescola e assim que conseguiu a categoria D foi atrás de um trabalho (Foto: Arquivo pessoal)

De volta ao Nordeste

Cacia conversou com o marido e decidiram voltar ao Nordeste. Foi quando apareceu a oportunidade de criar uma empresa de transporte para levar os moradores de Flores do Piauí até a capital, Teresina. E no dia 14 de agosto de 2015 lá se foram os dois para a nova empreitada. Mas no dia 11 de outubro de 2015, Cacia passou por um dos momentos mais difíceis de sua vida, a perda do marido.

A partir daí, a motorista passou a fazer todo o transporte sozinha. Cacia faz um percurso de 400 km em cinco horas levando passageiros até a capital para diversos serviços, principalmente médicos. De ônibus, a viagem dura um dia todo. Cacia ainda transporta pessoas de Ribeira do Piauí, uma cidade a 28 km da sua.

“Meu marido faleceu e eu tô aqui na lida. No momento, estou um pouco parada porque um carro bateu na minha van e estou há cinco meses nessa situação. Na verdade, meu sonho é trabalhar em uma carreta. Espero que antes de morrer eu consiga chegar lá”, declara.

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O acidente

A linha que começou em agosto de 2015 foi interrompida em 25 de setembro de 2016 com o acidente. “Da minha cidade até Teresina são 400 km. É complicado você fazer essa linha, conquistar os passageiros, e com essa batida eu deixei de ganhar dinheiro”, afirma.

Cacia estava levando um grupo de pessoas que saía de um comício, quando um carro em alta velocidade bateu em sua van. O motorista, bêbado, sobreviveu, ninguém se feriu, mas ele não ajudou em nada no concerto da van.

Cacia faz um percurso de 400 km em cinco horas
Cacia faz um percurso de 400 km em cinco horas

Vida que segue

Atualmente, sempre que possível, Cacia transporta pessoas com seu carro de passeio. A motorista recebe apoio do filho, do mesmo modo como foi incentivada a terminar os estudos quando chegou em São Paulo, em 2011.

Mulher no volante, novidade constante

Cacia é a única motorista mulher em Flores do Piauí, por isso, o espanto de alguns homens em determinados lugares é quase inevitável. “Alguns homens ficam de queixo caído. Eles ficam ainda mais surpresos com a mulher no volante se for um carro um pouco maior”, afirma.

“Há um tempo, parei em um ponto que conheço e tinha um rapaz esperando. Eu fui ajudá-lo com as malas. Quando ele entrou no carro perguntou baixinho: ela é a motorista? Ele ficou meio apreensivo. Quando chegamos, perguntei se havia sido aprovada. Ele deu risada e confessou que teve medo quando me viu entrar na van, mas aprovou e deu nota dez”, afirma dando risada.

Incentivando as mulheres

Assim como Cacia tem o sonho de dirigir uma carreta, a motorista incentiva outras mulheres a seguirem seus objetivos. “Eu ensinei uma amiga em São Paulo a dirigir. Pegava o domingo à tarde e perguntava: você quer aprender? Então vamos!” E assim segue a motorista, aguardando a reforma da van para continuar seu trabalho e ajudar mais e mais pessoas no interior do Piauí.

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