“É preciso que o governo implemente um financiamento diferenciado para os produtos Euro 5”

por Mauro Cassane
Editor do Portal

O paulistano Antonio Roberto Cortes está há mais de 30 anos no setor automotivo. Praticamente o mesmo tempo que os brasileiros começaram a ver caminhões com o “bolachão” da Volkswagen estampado na grade dianteira.

Aos 56 anos, presidente e CEO da MAN Latin America, o executivo está na Volkswagen desde 1994 e, em 1998, fez história ao transformar a Volkswagen Caminhões e Ônibus em uma área de negócios com mais independência da fabricante de automóveis.

Depois da inauguração da fábrica em Resende/RJ, em 1996, os caminhões da marca assumiram um novo status no mercado nacional: passaram a fazer frente às marcas mais tradicionais. Não demorou, já no começo deste novo século, a assumir, nos mais importantes segmentos, a liderança do mercado.

Agora, anunciada a fabricação dos “pesadões” da MAN, a empresa vai brigar com as marcas mais tradicionais no rentável segmento dos extrapesados. E a briga promete ser das boas.

Nesta exclusiva entrevista ao Portal Brasil Caminhoneiro, Cortes fala dos planos futuros da MAN, analisa o mercado, exorta o governo a dar mais incentivo aos caminhões com motorização mais amigável ao meio ambiente, e deixa bem claro que a chegada das marcas chinesas não preocupa.

Há quase uma década como líder do mercado nacional de caminhões, quais os planos da MAN para se manter na liderança mesmo com a chegada de competidores que já estão atacando o mercado com preços bem inferiores aos praticados?
Chegamos até aqui atendendo nossos clientes sob medida, com um pós-vendas nacionalmente reconhecido e com uma rede de 145 concessionárias, que é referência em pessoal treinado e tecnologia. É seguindo esse caminho que pretendemos manter a liderança no mercado brasileiro de caminhões, e conquistar ainda mais fatias do mercado de ônibus, no qual também crescemos consideravelmente em 2011.

Com quase 115 mil unidades emplacadas até agosto, o senhor acredita que o mercado total de caminhões pode fechar com quantas unidades neste ano?
Nossa previsão, com base nas projeções de entidades como a Anfavea, é de que o mercado brasileiro feche 2011 com aproximadamente 180 mil unidades.

E no ano que vem? O mercado total ficará no mesmo patamar deste ano, sobe ou cai?
Por conta do incremento de preço em função das novas tecnologias, estamos prevendo uma transição não muito fácil, caso o Governo Federal não reconheça a necessidade de se incentivar a compra dos modelos equipados com motores Euro 5.

O senhor arriscaria um palpite sobre o tamanho do mercado nacional de caminhões no final desta década (2020)?
É difícil arriscar um palpite para um futuro ainda distante, mas posso dizer que a MAN Latin America vem crescendo de forma consolidada justamente porque o seu planejamento contempla um futuro cada vez mais promissor para o Brasil. Estamos nos preparando para, a médio prazo, ampliarmos nossa capacidade anual de produção das atuais 82 mil unidades para 100 mil veículos. No entanto, para o ano de 2012, possivelmente não iremos experimentar esse crescimento. Podemos, sim, observar uma queda das vendas pelo motivo já mencionado acima.

Alguns analistas do setor previram uma grande movimentação neste segundo semestre para compra de caminhões novos devido à  antecipação de compras, por conta da nova legislação ambiental, que vai elevar os preços dos caminhões no ano que vem.  Até agosto, este movimento não aconteceu. A MAN, como está na liderança, já está sentindo este movimento ou as vendas para vocês também continuam absolutamente dentro da média esperada para este período?
Na MAN Latin America registramos algumas compras antecipadas, mas nada muito substantivo. Porém, acreditamos que os excelentes resultados de 2011 sejam também fruto do que chamamos de “efeito pre-buy”, ou seja, da antecipação de compras de alguns frotistas, que já sabem que os modelos 2012 custarão mais, pois terão mais tecnologia.  Para garantir que mercado e indústria comecem 2012 sem grande impacto causado por esses preços mais altos, a MAN Latin America defende que o governo implemente um financiamento diferenciado para os produtos Euro 5. Batizamos esse financiamento de Finame “Verde”, com uma taxa de juros equivalente ao Programa Procaminhoneiro do PSI 1, em torno de 4,5%, reduzindo desta forma o custo total de aquisição dos veículos Euro 5.

No acumulado de janeiro a agosto deste ano, a MAN vendeu quase seis mil caminhões a mais que sua principal concorrente. No ano passado, neste mesmo período, a diferença de vocês para a segunda colocada era de pouco mais de mil unidades. O mercado cresceu e vocês aumentaram significativamente a liderança. O que aconteceu?
O nosso objetivo é de sempre crescermos acima do mercado. E temos conseguido isso nos últimos 10 anos.

Há rumores de que teremos uma grande retração no mercado de caminhões no ano que vem em função dos aumentos de preço por conta da nova motorização. O senhor acredita que isto possa, de fato, acontecer?
A entrada em vigor do Proconve P7 exigirá um período de transição da indústria e do mercado. Cem por cento dos caminhões receberão novos motores, e a cadeia produtiva não reagirá rapidamente a tamanha mudança de uma só vez. Além disso, produtos fabricados até 31/12/11 só poderão ser vendidos no País até 31/3/12. São muitos desafios a serem enfrentados num curto espaço de tempo, que podem sim refletir nas vendas. Esperamos que, se houver esse efeito, que o mesmo seja pequeno.

Como já dito anteriormente, a reivindicação da indústria é a criação de uma linha de financiamento especial que beneficiará o transportador e preservará a cadeia produtiva (montadoras, autopeças, prestadoras de serviço).

Na sua opinião, a crise circunstancial do momento, principalmente com efeito negativo no mercado de ações pelo mundo, pode gerar uma nova crise mundial com as dimensões dramáticas da crise de 2008 no mercado de caminhões?
Não podemos descartar que uma nova crise afete o setor, mas caso ela ocorra, acreditamos que seus efeitos serão em proporções bem menores do que em 2008. De qualquer forma, caso isso ocorra, Brasil e indústria estão preparados para enfrentá-la.

A chegada de caminhões chineses importados já incomoda?
Independentemente de sua origem ou filosofia, os novos competidores terão que convencer seus clientes potenciais sobre a robustez, manutenção descomplicada, o custo-benefício de seus produtos e seus serviços em todo o território brasileiro. Esse caminho é longo, e já houve ocasiões em que alguns concorrentes desistiram de segui-lo. O consumidor brasileiro sabe o que quer, e exige o melhor.

O senhor acredita que caminhões automatizados serão predominantes no mix de produção da indústria nacional ainda nesta década?
Para os veículos pesados, acreditamos sim em uma predominância para os próximos cinco anos, uma vez que a venda de veículos nessa configuração tem sido cada vez mais frequente. Para os veículos leves, como a relação de custo entre caixa de transmissão e veículo ainda é grande, acredito que sua predominância ainda demore um pouco mais.

Fotos: Malagrine Estúdio

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